Tuesday, February 9, 2010

Momento: a duas vozes (parte XI)



ELE

Observava-as de longe. A empatia de Marylin com Sofia foi imediata. Olharam-se e entregaram-se. Marylin parecia estar a adorar a experiência, a conquista de Sofia. Sofia estava feliz. Nunca tinha visto a minha bebé tão feliz. Estávamos os três a ter momentos inesqueciveis, longe dos problemas, longe dos conflitos. Suspirei. Um suspiro que veio bem cá do fundo, sabia o que me esperava, não ia ser uma batalha fácil conseguir ter Sofia na minha vida outra vez. Suspeitava que Ana não me ia nada facilitar as coisas. Eu compreendia a dor dela, nem quero por algum momento pensar o que seria perder a Sofia, mas a verdade é que ela não podia pensar apenas nela mesma, nem Sofia seria substituta do que Mariana foi. Sentado na areia, senti a brisa que vinha do mar, brisa essa que brincava com os cabelos delas, arrastavam o som das suas gargalhadas para longe. Sim estava a ver um fim de semana espetacular. Eu estava a adorar cada minuto, que cada vez mais parecia se aproximar do fim. Marylin sentou-se ao meu lado, colocando o braço por cima do meu ombro.
- Estás feliz? perguntou-me ao mesmo tempo que me dava um beijo carinhoso
- Sim estou claro. Como poderia não estar?
- Helder, sabes que tenho medo do que aí vem. - disse ela, seu olhar escurecendo um pouco
- Eu sei, eu também tenho medo. Não queria que ninguém sofresse, mas parece-me que vai ser inevitável. Ana é uma mulher determinada, sabe o que quer, e vê em Sofia a Mariana que perdeu. Eu entendo-a. Juro que entendo, é horrível perder-se um filho. Mas a Sofia não é filha dela. Nunca devia ter autorizado ela viver com eles. Nunca me vou perdoar por isso.
- Mas tu tinhas as tuas feridas para cuidares, não estavas em condições de ficar com a menina. Eu acho que fizeste o mais acertado. Qualquer outro no teu lugar teria feito o mesmo.
- Sim mas fui um bocado covarde.
- Não considero covardia darmos tempo para lamber as nossas feridas. Vocês homens encontram o vosso rumo diferente de nós. Nós eventualmente no teu lugar, iríamos nos agarrar a essa criança para arranjar forças para superar a dor, os homens reagem diferente, precisam de colocar os sentimentos no lugar.
Ficamos em silêncio. O mar estava calmo, o dia esplendorosamente bonito. Sofia tentava se equilibrar na areia, mas como existia um ligeiro declive ela caía e rebolava, sentava-se depois rindo-se de si mesma, até tentar se erguer outra vez. Nunca imaginaria em momento algum que fosse sentir um amor tão incondicional, tão forte por alguém. Por ela era capaz de tudo. Eu que nunca me tinha visto no papel de Pai, era daqueles papéis na vida que eu julgava que não fossem destinados para mim. Agora tinha a responsabilidade de uma vida nas minhas mãos. E estava assustado, muito assustado. E se não fosse sucedido neste papel? É que eu não tinha ideia do que era ser pai, quer dizer na teoria tinha, mas na prática nem tanto assim. O meu pai tinha sido um pai ausente, em constantes viagens de um lado para o outro, as recordações desses momentos eram sempre acrescidas de mágoa quando ele aparecia, as constantes discussões com a minha mãe. As ofensas dirigidas um ao outro, não havendo entendimento possível entre as partes, até que o inevitável aconteceu, e deu-se a separação já antes tão óbvia. Nunca mais vi meu Pai. Perdeu-se no mundo, cortou os laços com os filhos. Não lhe estava simplesmente no sangue ser Pai ou marido. Esperava que não tivesse herdado nenhum gene que fizesse o meu comportamento ser de alguma forma parecido com o meu progenitor. Uma criança não deveria crescer sem um dos pilares que lhe sustenta a vida, para isso esses pilares têm que ser fortes, têm que poder sustentar o peso de uma vida. E não é tarefa fácil. Felizmente quando um dos meus pilares se quebrou o outro tornou-se suficientemente forte para aguentar com a carga sozinho. E isso sim era de mérito, reconstruir-se uma vida, depois de ilusões deitadas pela janela não tinha sido tarefa fácil. Mas a minha mãe, tal como Marylin referiu encontrou no amor dos filhos a vontade de abraçar a vida novamente, de combater as dificuldades e sair vencedora. E saiu. Gostaria de poder apresentar Marylin á minha mãe. Iria - lhe sugerir isso brevemente. A sua presença na minha vida era de carácter permanente, logo queria dividir com ela a pouca família que me restava. De certeza que se iriam dar bem, minha mãe apenas queria uma coisa, que fossemos felizes. Tinha sofrido imenso com a perda de Mariana, a amizade delas estava a desenvolver-se. Mas ainda sofria mais por me ver sofrer. Mãe e Pai é assim mesmo não é? Sente as nossas dores, partilham da nossa aflição. Voltei a olhar para a minha filhota linda, eu estava agora a aprender a amar, este amor incondicional, em que tudo nos parece perfeito, em cada dia mais ficamos dependentes daquele pequenino ser que toma conta da nossa vida. E eu estava a adorar.

Autoria: Lcarmo (Bela)
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4 comments:

Pat said...

Lindo texto!~
Oh eu sei que me torno repetitiva, mas é que são mesmo muito bonitos os teus textos.
Continua a escrever assim, porque apesar de comentar pouco e sempre o mesmo, vou ler sempre.

dá gosto :)

abelha**

Libelinha☆ said...

Da maneira que descreves esse amor de mãe/pai Filho/a... Dá vontade de ter Gafalinhos, hehehe!...

Beijinhos ;P

Poetic Girl said...

Abelha: Não te tornas nada repetitiva! ainda bem que estás a gostar deste meu conto, tem mesmo muito de mim... prometo continuar com os próximos capítulos... bjs

Libelinha: Ai tu vê lá olha que não quero essa responsabilidade, depois tenho que ser madrinha virtual...lol bjs

Brown Eyes said...

Como diz a Abelha temos que nos tornar repetitivas porque esta história melhora de capítulo para capítulo, acontecendo, muitas vezes, ficarmos sem palavras perante o desenrolar da história. Bela só te digo que estou ansiosa pelo próximo capítulo. Beijinhos