Saturday, November 21, 2009

Momento: a duas vozes (Parte III)

ELE

Procurei-a. Percorri cada centímetro daquele local apinhado de gente e não a encontrei. Senti me desolado. Esperava que tivesse apenas se ausentado, que voltasse. De cada vez que alguém entrava, eu olhava, tentando adivinhar a sua figura nos corpos das outras mulheres, tentando vislumbrar o seu sorriso, o seu cabelo. Desisti. Não me restava mais nada a não ser ir me embora. Tentar me convencer a mim mesmo que não, que não tinha imaginado, que ela realmente existia. Pensaria numa forma de a encontrar novamente. Nem que tivesse que voltar, noite após noite, até nos encontrar-mos novamente. Despedi me dos meus acompanhantes. O segurança não se encontrava á porta, estranhei o facto, mas saí despendindo me da menina da recepção. Estava escuro, senti frio. Um arrepio percorreu a minha espinha, aconcheguei mais o casaco. Tomei nota que da próxima vez traria uma roupa mais quente, andar em camisa em pleno inverno e numa noite fria como aquela não era mesmo muito inteligente. Reinava a confusão na rua. Um amontoado de gente rodeava dois carros atravessados na via. Continuei meu caminho. Provavelmente um pequeno acidente, algum toque que alguém terá dado ao executar a manobra. Vislumbrei o segurança, gesticulava e falava com quem estava ao seu lado. Um rapaz magricelas segurava a cabeça entre as mãos, parecendo ligeiramente assustado. Impressionou me a imagem. Teria sido realmente mais grave do que eu imaginava? Tentei visualizar o que se passava sem atravessar. Dois carros, um deles enfaixara-se completamente no outro, Aproximei me, a minha necessidade de ajudar me impulsionou a isso.
- Então que se passou aqui? - perguntei ainda não conseguindo estar muito próximo
- Um acidente, este carro estava a fazer a manobra para sair do estacionamento quando foi atingido pelo outro que veio desgovernado em sua direcção.
- Há feridos? - perguntei
- Sim há, aquela miúda ali. Já chamamos uma ambulância devem estar a chegar.
Olhei para onde ele apontou. O meu olhar ficou congelado num rosto familiar. Senti o pânico me invadir. Ela ali estava, sentada na beira do passeio, seu rosto transtornado. As lágrimas escorriam lhe pelas faces. Corri para o seu lado. Tomei-a em meus braços, não sabendo muito bem se seria a atitude correcta.
- Estás bem? perguntei ofegante
- Sim estou - respondeu me por entre lágrimas. - Acho que tenho o braço partido. Dói me imenso.
Apertei-a mais contra mim. Estava gelada. Despi meu casaco e aconcheguei-o nos seus ombros.
- A ambulância vem aí... vais ter a assistência que necessitas.
A ambulância chegou finalmente. Foi prestada a assistência aos dois condutores. O rapaz estava mais assustado que magoado. Não tinha ferimentos visiveis, mas mesmo assim foi visto por alguém. Ela tinha mesmo o braço partido, teria que ir para o hospital para receber os cuidados necessários.
- Quer que alguém a acompanhe na ambulância? - perguntaram-lhe
Olhou para mim. Hesitou por uns breves momentos, depois perguntou-me:
- Vens comigo? Sentirei me melhor se tiver alguém conhecido. Detesto hospitais.
Abri a boca para falar, mas nenhum som saiu. Ela olhava me interrogando me com o olhar. Por segundos foi como se o tempo tivesse parado. Acordei da minha letargia quando ela interpretou o meu silêncio como um não e se dirigiu para a ambulância.
- Espera! - gritei, chamando a atenção para mim - Claro que vou contigo.
Ajudei-a a entrar para a ambulância. Sentamo-nos lado a lado. A porta fechou-se. Ficamos sozinhos.
Nenhum de nós falou. As palavras estavam-me presas na garganta. Tanta coisa a dizer, um misto de emoções á flôr da pele, eu só conseguia olhar para aqueles olhos côr de amêndoa e me perder. Inconsciente dei lhe a mão. Ela apertou a minha mão com força. Sentia-a acariciar a palma da minha mão, correntes de energia atravessaram todo o meu corpo. Estremeci e não era de frio.
- Não sei o teu nome. - disse me ela olhando directamente nos meus olhos
- Helder - respondi - Não sei o teu também.
- Marylin - respondeu me
O silêncio instalou-se novamente. Não era um silêncio constrangedor de forma nenhuma, era um silêncio de cumplicidade, de duas almas que estavam em sintonia. Fechei os meus olhos por segundos, respirei profundamente, apertei mais sua mão para me convencer que não passava de um sonho. E não era um sonho, era real bem real e sorri. Porque quando certos caminhos de cruzam, nem a vida os pode descruzar.

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